Qualquer um de nós gostaria de voltar as costas ao mundo, por mais ou
menos tempo, e iniciar o percurso a este lugar se sentir.
Sintra acolhe este sítio esotérico, idealizado no sonho romântico,
mítico e mágico de Carvalho Monteiro e do arquiteto italiano Luigi Manini que o
consubstanciou para, hoje, nossos sentidos se apaziguarem.
Não sabemos se esta menina que sozinha ali caminha, pensará nos
estilos arquitetónicos do Palácio que se entrecruzam do gótico ao manuelino ou
renascença.
Não sabemos se estará interessada na história trágico-marítima que
esta Quinta de regalo (Regaleira) pretende evocar para enaltecer a giesta dos
andantes marítimos; não sabemos se estará interessada nas simbologias míticas,
místicas e iniciáticas que estão omnipresentes neste espaço sacralizado, diria
até profanamente sacralizado.
Mas se quisermos entrar na Quinta e neste ‘Palácio dos Milhões’,
através da fotografia, estejamos atentos. Podemos, de repente, entrar num
regresso ao passado e encontrar algum Templário conversando com um Rosa Cruz a
relembrarem outros combates. Podemos escutar fórmulas de juramentos secretos de
alguma reunião de Lojas Maçónicas. Podemos ser apanhados por seres invisíveis
que nos vendem os olhos e nos façam subir das trevas para a luz, na espiralada
escadaria do poço iniciático.
Devíamos avisar esta menina já nascida que, nesta Quinta e no Palácio
que a olha, poderá voltar a nascer. Se subir, desde qualquer uma das oito
pontas da estrela que embeleza o fundo do poço, não estará apenas a emergir do
ventre da Mãe Terra, não estará apenas a sair do Útero Primordial e a deixar a
proteção amniótica. Poderá também ter de perceber o percurso inverso, o caminho
heraclitiano, sempre o mesmo, mas diferente no subir e no descer! Aqui, ao
subir, deixará a segurança uterina de onde provém a vida, mas também poderá descer,
entrar de novo no ventre da Mãe Terra, a Sepultura onde tudo e ela têm de
regressar.
Também está lá a alquimia de qualquer rei Midas, o equilíbrio precário
que os visionários sonham, procuram, encontram, transformam e perdem para
poderem sempre transgredir!
Então, visitemos e sonhemos transgredir. Talvez assim possamos estar
dentro e fora de nós e das estrelas que o universo contém. E, se for noite, adormeceremos,
tarde ou cedo, mesmo que a alma não nos fique adormecida.
Foto: Osvaldo Castanheira
Texto: Maria dos Anjos Fernandes
Postado por Carlos Cotter